Festa da Leitura?

Estamos a alguns dias da 27º Feira do Livro de Osório, a festa máxima da literatura no município. Mas temos mesmo uma festa dedicada à literatura ou uma atividade voltada a confete e serpentina?

Repetindo os mesmos erros de anos anteriores, o município ainda não divulgou a programação completa da feira, não há folders, cartazes, nada. A AELN – Academia de Escritores do Litoral Norte gaúcho tentou divulgar o evento no último sábado, na Feira do Produtor, no Largo dos Estudantes. Mesmo estando na agenda do grupo desde o início do mês, conforme acordo prévio com o setor de cultura de Osório, a Secretária de Cultura nada sabia sobre a atividade. Uma vez mais se perdeu a oportunidade de divulgar a comunidade e aos visitantes, que estavam em meio a um feriadão, o evento literário que se aproxima.

O projeto de Feira de Livro de Osório é um fracasso, visível para quem participa de inúmeras outras feiras no Litoral Norte e fora dele. Simplesmente não há organização. O que se faz aqui é improvisação. Para se ter uma ideia do atraso na divulgação e organização da feira de Osório, Capão da Canoa já trabalha com a programação da feira do próximo ano, que ocorre em abril/maio de 2013. Algumas outras cidades também já estão com os projetos em andamento, com três ou quatro meses de antecedência. Aqui a própria visão de que há necessidade de conceder a patronagem, pela terceira vez nos últimos quatro anos, à alguém que sequer tem livro publicado ou mesmo produção literária, já indica que a “festa da leitura” de Osório não segue caminhos definidos. Qual a função do patrono, faz parte da decoração?

Recentemente a Escola 9 de Maio, em Imbé, deu um exemplo de organização e amor à literatura. Durante alguns meses a escola trabalhou com alunos a produção literária de escritores da AELN e organizou um Sarau Literário para homenageá-los. Surpreendentemente os alunos realizaram pequenos filmes e peças de teatro com os textos, poemas e crônicas. O trabalho foi organizado e apresentado diante de toda a escola.

São iniciativas como essa que merecem ser seguidas. A feira do livro é, seria, no caso de Osório, o ápice de um trabalho realizado durante o ano nas escolas e bibliotecas. Com o trabalho do patrono utilizado dentro da sala de aula, a feira seria o encontro de quem produz literatura com quem lê. Como fazer isso com alguém que não tem trabalhos publicados ou produção literária? Como instigar o gosto pela leitura apresentando como exemplo alguém que não produz literatura? Como alguém que não viveu a experiência do processo porque passa a produção de uma obra literária, as críticas e os elogios, as agruras, os desafios, sucessos e fracassos, pode contribuir com a feira do livro?

O professor Juracy Pasquoto merece ser homenageado pelo que fez pela educação em Osório? Com toda a certeza, mas não dá para misturar as coisas. Seria como conceder o prêmio de médico do ano ao enfermeiro da ambulância.

Para que isso mude, para que a festa da leitura seja de fato uma festa dedicada à literatura e não a venda pura e simples de livros, além de render homenagens a vultos da cidade, é necessária a criação de consciência de valor e atuação crítica da comunidade envolvida, sem partidarismos.

Literatura e cultura não se impõem. Nascem e amadurecem, com a produção daqueles que trabalham durante o ano, nas escolas, nas bibliotecas, nos saraus, nas atividades culturais. Daqueles que vivem o dia a dia do processo criativo, do contato com o leitor, do contato com a crítica. Daqueles que percorrem o duro caminho entre a criação, a produção, e, finalmente, da publicação de seus trabalhos. Às vezes, com esforços ímpares, que os privam do convívio com os familiares por algum tempo, enquanto buscam apoio, patrocínio ou editoras interessadas. Conceder a patronagem a alguém que jamais seguiu esses passos é zombar de quem já o fez, de quem trabalhou duro para chegar lá. Conceder a patronagem da festa da leitura e do livro a alguém que não publicou obras, por menor que tenham sido, é desmerecer todos aqueles que lutam cotidianamente para que a literatura tenha um espaço maior na mídia do nosso país – que ainda engatinha nessa área; sabidamente o brasileiro não lê. E mais, é acreditar que o leitor osoriense dará crédito a feira do livro dessa forma organizada e que ela irá contribuir com o zelo pela literatura entre os leitores jovens, que são o futuro da comunidade, quiçá futuros escritores.

Enfim, a crítica não é a pessoa do patrono, mas a política que é empregada para defini-lo e a política que é aplicada para a realização da feira do livro. Política que escolhe uma única semana para homenagear a literatura e esquece dela durante os outros 360 dias do ano. Política que permitiu que a biblioteca pública municipal perdesse parte de seu acervo devido ao mal estado de conservação do prédio histórico, que também preserva o arquivo da cidade – também em franco estado de deterioração. E não foi, efetivamente, por falta de avisos.

São essas políticas mal planejadas, e com visão de alcance limitada, os principais fatores que dificultam o desenvolvimento turístico cultural de Osório. Seria interessante que a comunidade fosse ativa, crítica, responsável e lutasse por um Osório melhor, desenvolvido e que, num futuro próximo, fosse colhedor dos frutos de uma atividade turística e cultural consciente, benéfica a todos.

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