Minha vida é um facebook escancarado

A sentença “Minha vida é um livro aberto”, neste terceiro milênio, foi sepultada, com pompas e circunstâncias, para todo o sempre.

O dito somente era o emblema de quem caluniado, injuriado ou difamado, nada tinha a esconder de seu passado. Era um ser de conduta ilibada, sem mãos e ficha sujas, opostamente do que é hábito em Brasília.

A nossa realidade global há algum tempo caminha no mundo antevisto em “1984”, a magnífica obra de George Orwell, escrito em 1948. Nela o autor fala de um mundo dominado pelo socialismo totalitário – reflexo do período pós-guerra quando Orwell, se desiludindo cada vez mais com os rumos do “socialismo” de Stalin, escreveu o livro. Orwell compõe com brilhantismo uma “utopia negativa” onde os cidadãos são vigiados todo o tempo em todo lugar pelas teletelas (aparelhos que transmitem e captam som e imagem) sob a liderança do Partido e do Grande Irmão. Em todos os lares dos membros do Partido, praças, ruas e locais públicos, as teletelas transmitem a ideologia do Partido. Mais do que isso, captam todos os movimentos de seus filiados.

1984 não é apenas mais um livro de política, mas uma metáfora de uma realidade que inexoravelmente estamos construindo. Para exemplificar, invasão de privacidade; avanços tecnológicos que propiciam vigilância total; destruição ou manipulação da memória histórica dos povos.

Como já frisei acima, a nossa realidade global há algum tempo caminha no mundo antevisto em 1984, o ser humano não terá nenhuma defesa, sobretudo o ingênuo e dependente patológico das redes sociais, o narcisista, o megalômano que disso não se apercebeu e, hoje, desbragadamente, confessa para o “Grande Irmão” toda a sua vida, seus sonhos, os projetos, as desilusões, os dramas, as alegrias, as vitórias, as derrotas, suas tristezas, suas tragédias, as traições, as fatalidades, o real sentido da existência e, finalmente, a descoberta – tardiamente ou não – do grande amor, mesmo em suas mais diversas formas…

Não lido com as sofisticadas ferramentas que compõem as redes sociais. Preservo o que sobra de minha privacidade que, compulsoriamente, é invadida. O olho do “Grande Irmão” está em todos os lugares e é implacável: nos shoppings, nas artérias mais movimentadas das cidades, nos bancos, nos ônibus e lotações, nos aeroportos, nas portarias de edifícios e nas repartições públicas.

A revelação de sua intimidade nas redes sociais, realmente, a quem interessa? Quais os ganhos dessa exposição? Que sórdidas mentes não estarão à espreita para desfecharem o irreversível golpe de misericórdia no incauto confessante?

O boleto da conta ainda não bateu à porta.

E talvez seja caro demais.

Comentários

Comentários