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Morte às APAEs – por Júlio Almeida

Neste país, “abençoado por Deus e bonito por natureza”, algum burocrata do alto de sua cadeira do Ministério da Educação em Brasília entendeu por resolver os problemas das pessoas com necessidades especiais decretando a morte das APAEs, estabelecendo como meta 4 do Projeto de Lei do Plano Nacional de Educação – PNE -, a obrigatoriedade de matrícula  escolar dos estudantes  entre quatro e dezessete anos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação na rede regular de ensino, ou seja, deixou de dizer que tal aluno teria matrícula “preferencialmente” na rede regular.

Mais, a partir de 2016 exclui do cálculo do repasse do FUNDEB as escolas da APAE, mantendo apenas as escolas públicas.

Tal previsão parece inocente, inclusiva e bem intencionada. Grande engodo.

Na verdade, ao estabelecer tal obrigatoriedade, literalmente joga, não só os alunos das APAEs, mas também aqueles das Escolas Especiais Públicas nas nossas ainda precárias escolas de educação básica regular da rede pública. Precárias sim, pois salvo exceções, as carências da rede pública são evidentes e graves.

Como os alunos da rede regular, e mesmo os professores, reagiriam diante das necessidades, ritmo e tempo de um aluno especial? Como o aluno especial reagiria e aproveitaria o ritmo e tempo do aluno típico da rede regular?

Sem dúvida, nenhum um nem outro estão preparados para essa inclusão meramente formal. Sim, apenas formal porque se diria que no Brasil, todos são iguais e recebem o mesmo tratamento. Vide as filas do SUS, da habitação, da educação infantil, etc.

Mas na prática, quanto prejuízo, quanta exclusão fática!

O verdadeiro excluído é aquele que não tem acesso ao bom serviço de educação adequada. Somente pelo atendimento qualificado, atencioso, paciente e repetido é que o aluno especial pode efetivamente progredir e tornar o mundo ao seu entorno um pouco menos árido.

O que digo e por isso apoio as APAEs e Escolas Especiais Públicas é que a Constituição Federal em seu art. 208, inciso III; A Lei de Diretrizes e Bases da Educação em seu art. 4º, inciso III e o Estatuto da Criança e do Adolescente em seu art. 54, inciso III, garantem o atendimento especializado e gratuito aos portadores de necessidades especiais PREFERENCIALMENTE na rede regular. Ora, evidente que a regra é a matrícula na rede regular, mas jamais se pode fechar a porta da escola especial ao que, pela sua peculiar condição, dela necessite. O desigual também precisa se reconhecido como tal, não como preconceito ou exclusão, mas como detentor de direitos e cuidados diferentes.

Seria interessante que os – poucos – defensores deste absurdo ao menos não ofendessem a Constituição Federal, que garante a opção pela escola especial.
Felizmente, por mobilização dos apaeanos e apoiadores, recentemente a Comissão de Constituição e Justiça do Senado, através de uma emenda do Senador Vital do Rego, recolocou a expressão “preferencialmente” na famigerada meta 4.

Há que se ficar atento às novas manobras indevidas e dizer que para realizar uma verdadeira inclusão basta que se obedeça a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – art. 60 – a ampliem-se as condições da rede regular de receber os especiais, aumentem-se os investimentos, capacitem-se os professores, preparem-se os alunos e universalize-se o aceso, mas não matem as APAES e as escolas públicas especiais.

Não eliminem também a possibilidade de que, na incapacidade do poder público, abnegados apaeanos e integrantes das escolas especiais, possibilitem a inclusão efetiva e garantam uma vida um pouco menos árdua aos nossos desiguais.

Júlio Almeida
Promotor de Justiça da Infância e Juventude

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