Nova lei sobre prisão e medidas alternativas
Parece-nos que, além das importantes inovações trazidas pela legislação em comento, a principal marca da Lei nº 12.403/11 é a de estabelecer, em definitivo, que a prisão cautelar é uma exceção, sendo o status libertatis a regra.
Segundo Luiz Flávio Gomes, em dezembro de 2010 o Brasil atingiu a marca de 500.000 presos, sendo que deste total, 44 % são presos provisórios, ou seja, aproximadamente 220.000 presos através de prisões cautelares.
Este número absurdo deixa transparecer que infelizmente, a prisão processual tornou-se regra no Brasil, seja em razão de nossa legislação antiquada, seja por força da mentalidade punitivista de grande parte dos magistrados e demais atores do sistema de justiça.
Entendemos que um Estado democrático não pode sofrer de “ansiedade punitiva”, uma vez que a antecipação dos efeitos da tutela penal deve, necessariamente, obedecer ao princípio da proporcionalidade. Acima de tudo, em respeito ao principio da presunção de inocência, a prisão processual deve retornar ao seu lugar de medida extrema.
De acordo com Guilherme Nucci, a introdução das medidas cautelares no sistema processual penal podem ter resultado positivo, pois se a legislação brasileira já possuía medidas alternativas à prisão pena (Lei nº 9.714/98), não se pode negar o seu caráter intimidativo enquanto medida cautelar.
A seu turno, Aury Lopes advoga que para além desta reforma legislativa, torna-se necessária uma mudança de mentalidade dos atores judiciários para que se alcance um processo penal democrático, com “rompimento da cultura inquisitorial-encarcerizadora dominante”.
Vislumbra o autor ainda, um novo risco: a degeneração e banalização das medidas cautelares diversas, representando uma imensa expansão do controle penal. No entanto, vê com bons olhos o rompimento da lógica binária prisão preventiva e liberdade provisória, assim como, a revitalização do instituto da fiança.
Enfim, a reforma no sistema era urgente, no intuito de coibir casos escabrosos como o daqueles cidadãos que passam todo o curso do processo presos, para serem absolvidos ao final, ou então, terem a prisão substituída por penas alternativas.
Acreditamos que esta reforma pontual deve ser recebida como uma nova ferramenta jurídica posta à disposição dos operadores do sistema penal, que tem como principal objetivo contribuir para uma mudança de paradigma acerca da banalização da prisão processual como única medida cautelar penal. Servirá para balizar de forma democrática o tensionamento constante vivido no processo penal, entre o direito de punir do Estado e as direitos e garantias fundamentais do cidadão.
PRINCIPAIS ALTERAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI 11.403/11
a) A PRISÃO PREVENTIVA passou a ser medida cautelar excepcional, somente aplicável quando as outras medidas restarem insuficientes. A prisão cautelar passou a ser a extrema ratio da ultima ratio (CPP, art. 282, § 6º).
b) Ampliação do rol das medidas cautelares, antes centradas na prisão preventiva e na liberdade provisória. Relevo para o respeito ao princípio da proporcionalidade com ponderação acerca da adequação e da necessidade das medidas (CPP, art. 282).
c) Tentativa de compatibilização da Lei Ordinária processual com o princípio constitucional da presunção de inocência (CF, art. 5º, LVII) e bem assim, com a regra constitucional que regula as hipóteses de prisão (CF, art. 5º, LXI): “Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente (…)”.
d) Encerram-se as discussões acerca de quais as prisões processuais existentes no Brasil: apenas a prisão preventiva e a prisão temporária (CPP, art. 383). Lembrando que a prisão em flagrante é uma prisão pré-processual. Todas as demais estão revogadas.
e) Torna obrigatória a separação dos presos provisórios dos presos por sentença definitiva, haja vista que antes, a lei utilizava a expressão “sempre que possível”.
f) Altera o rol de cabimento da prisão preventiva, prevista no art. 313, inclusive possibilitando a sua decretação quando do descumprimento de outras medidas cautelares alternativas à segregação.
g) Reforça a garantia de comunicação da prisão à Defensoria Pública, caso o cidadão preso não informe o nome do seu advogado (CPP, arts. 289-A, § 4º; e 306, § único).
h) Ampliação das hipóteses de fiança, com o aumento de seu valor.
i) Criação de um banco de dados sobre os mandados de prisão, de caráter nacional, a ser mantido pelo Conselho Nacional de Justiça.