Colunistas

O exílio

Da série aPraça Júlio de Castilho e a Turma do Murinho

No final dos anos sessenta, Osmar Ferreira de Souza, morador do Edifício Oiapoque-Chuí, a poucos metros da Praça Júlio, também iria vivenciar fatos dolorosos. Aos 19 anos, ele falava com fluência o espanhol, o francês e o inglês. Desde cedo voltara sua preocupação às questões sociais. Sensível ao drama dos desamparados e da situação política do Brasil, sob a ditadura militar, com a qual não concordava, nunca escondeu sua irresignação.

Desencantado com o regime político então vigente no país, após economizar algum dinheiro, mochila nas costas, parte, em 1972, rumo ao Chile. Lá ele se liga, junto com outros brasileiros, à ativa militância política que apóia o presidente Salvador Allende, cuja derrubada viria a testemunhar.

Após três anos do governo socialista e democrático de Allende, em 11 de setembro de 1973, o General Pinochet lidera um dos mais bárbaros golpes de estado da América Latina, assassinando aquele presidente.

Ao se consolidar a ditadura, da mesma forma que a maioria dos estrangeiros ligados à causa de Allende, Osmar passa a ser perseguido implacavelmente pela DINA. Não lhe resta alternativa outra que não a fuga. E, com a mulher, busca asilo na Embaixada da Argentina, cuja entrada no prédio é recheada por lances angustiantes.

A embaixada, situada na Avenida Miraflores, 285, era cercada por um muro alto e mostra-se quase inexpugnável, aliada ao fato de que exército e polícia chilenos mantinham ali, como em toda a cidade de Santiago, um cerco ferrenho, de modo a não permitir a entrada de ninguém que não fosse do corpo diplomático.

Em desespero, Osmar, aproveitando-se do desmazelo dos militares e dos agentes de Pinochet, consegue vencer o muro, pulando para os jardins da embaixada. A mulher, no entanto, com o peso da gravidez, não logra ultrapassar o paredão. Em pânico, separada do marido que já se encontrava protegido, não tem escolha: arrebatadamente, enfrenta a barreira militar, rompe-a, certa de que, como um animal, seria abatida pelas costas: “Melhor a morte do que a rendição às forças de Pinochet”, seguramente estaria pensando. Mas, num rasgo de comiseração — ou negligência — que pareceria impossível naquela situação, a milícia queda-se inerte à busca desesperada da jovem mulher pelo asilo salvador, poupando-lhe a vida e a do filho que trazia no ventre.

Alguns meses depois, obtendo salvo-conduto, o casal deixa o Chile para residir e trabalhar em Paris. Com o advento da anistia, muitos anos depois, Osmar volta para o Brasil.

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