Os Maricás e as pedras no caminho dos colonos

Osório tem uma privilegiada área agrícola. Não apenas as regiões dos distritos de passinhos, passando pela estrada da perua, ou de Aguapés e toda a região do livramento, ou ainda na direção das emboabas ou, ainda, a região do entorno das lagoas do Marcelino, Peixoto, Orácio (assim mesmo, sem ‘h), Barros e tantas outras pequenas lagoas. A região de mananciais é uma área tremendamente favorável à agricultura familiar, em especial hortifrutigranjeiros e, em alguns casos, belíssimas lavouras de arroz.

Mas, em contrapartida, existe uma grande parcela de agricultores familiares cujas propriedades estão na área de morro: baixada, arroio das pedras, linha padre vieira, bocó, borrússia, goiabeira, figueira grande, tombador, costa da lagoa,  etc… Nestas localidades, dois problemas afligem o agricultor e provocam arrepios na espinha do pobre coitado: Maricás e pedras.

O morro de Osório, assim como de outras localidades da região, pertence à Serra do Mar, em grande parte transformadas em APP (área de preservação permanente). Mas isso é coisa moderna, criada a partir das Resoluções do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), e que tem editado resoluções aos pacotes, todo ano. Agora, a Secretaria do Meio Ambiente está iniciando novos estudos sobre as encostas de rios e arroios.

As propriedades e os costumes, são muito antigos. As taipas de pedra (aqueles muros que separam potreiros e propriedades) são de origem açoriana e, portanto, vieram pra cá trazidos pelos nossos colonizadores, há pelo menos uns 230 anos, já que a colonização açoriana chegou no RS em 1773, e em Osório, por volta de 1780).

Faz parte da vida do agricultor preparar a terra, abrindo coivaras, arredando as pedras, amontoando-as e depois aproveitando-as na forma das taipas (muros). Em alguns casos, em razão da declividade do terreno, estas taipas já servem como taludes, escorando o terreno de ponto em ponto. Isto, além de tradicional e algo de extrema necessidade, é uma arte. O colono não vende a pedra para jardins, o que claramente poderia ser considerado um crime contra o meio ambiente. O colono quer plantar a sua subsistência, quer manter a sua família e dar produtividade para a sua propriedade, tirando dela o seu sustento.

Basta dar um pequeno passeio pelas estradas vicinais no nosso morro da borrússia, pra ver a quantidade de propriedades abandonadas, as casas fechadas e o macegal tomando conta de tudo. A dificuldade para prover a renda e manter os filhos na propriedade rural é imensa, já que não existe política pública municipal de subsídio. O casal assiste aos filhos partindo, no ‘rumo da vila’, pra trabalhar no comércio ou na construção civil, e ficam sozinhos, pelejando contra uma secretaria de meio ambiente voraz por multas. Quando o colono, que muitas vezes resiste apenas com uma aposentadoria mirrada, recebe uma autuação de R$ 1.500,00 por ter feito uma taipa ou por ter derrubado uns pés de maricás, entrega os pontos. Larga tudo, vende os bichos, fecha a porteira, e vem se achegar na casa dos filhos.

Imagine se ainda tivéssemos a Agasa ou a Usina Santa Marta produzindo álcool!! Me criei passando férias nas casas dos meus tios, que plantavam cana pra vender pra Agasa. A derrubada era com queima, sem fiscalização alguma… O corte, braçal. Inúmeros caminhões Mercedes desciam o morro em estradas de saibro. A Agasa (Açúcar Gaucho S A) fechou no final década de 70, por decisão do governo do Estado. A usina Santa Marta, que produzia álcool ali no livramento, foi fechada na época da construção da Free Way, no final da década de 60, por interferência do IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool) e pra atender os interessados no consumo de gasolina. O álcool não era prioridade. Nenhuma destas duas grandes empresas teve problemas ou interferência de órgãos de fiscalização. Pelo menos as pesquisas do saudoso Guido Muri (Remembranças de Conceição do Arroio) e da Professora Marina Raimundo (Navegação Lacustre Osório-Torres) nada trazem a respeito.

Na atualidade, temos mineradoras abrindo a costa do morro com enormes crateras, jogando pó sobre as casas dos vizinhos, detonando seus explosivos sem critério de horários, derrubando árvores centenárias, desviando cursos de córregos e eliminando cachoeiras, mantendo a atividade sob os auspícios da FEPAM, do IBAMA, do DNPM, da PATRAM e, acredite, da Secretaria Municipal do Meio Ambiente.

Onde está a fiscalização? No mínimo, imagino, os fiscais estejam muito ocupados visitando as plantações de aipim dos pequenos agricultores, batendo fotos de maricás e contando pedras… E o que estava faltando, é que agora impeçam a plantação de aipim em propriedades que façam fundos pro rio que corta a borrússia, passa pelo Caará e vai tornar-se o Rio dos Sinos logo ali, em São Leopoldo e região.

Há que se orientar. Há que se educar para os cuidados com o meio ambiente. Mas o mais importante para todos nós, sem sombra de dúvidas, é que o colono continuo no campo, plantando e gerando renda para seu sustento. A Feira do Produtor só vai existir enquanto existirem agricultores.

Espero que a Secretaria do Meio Ambiente saiba que não comemos pedras nem maricás…

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