Poesia: negócio de grande responsabilidade

Para o poeta que acredita naquilo que escreve, a poesia é vista como uma “arte sem tréguas”, território onde se multiplicam sentidos. A arte sem tréguas liberta, causa estranheza, provoca desconforto, desafia a própria natureza da existência. Escrevê-la é experimentar o novo, o ato instantâneo e original do contemporâneo. Experimentar o novo não é sinônimo de rejeitar o que já existe, ou intuitivamente deixar de respeitar os idos estilos e métodos.

Pois, fabricar o novo pelo novo é estéril. É fato: a verdadeira novidade nasce sempre de uma volta às origens. Voltar às origens é ser autêntico, puro e sem máscaras. E voltar às origens é reconhecer que existem poesias perfeitas, e não poetas perfeitos. Voltar às origens, antes de tudo, é dar a nossas palavras outras possibilidades de vida.

Em nossos dias, multiplicam-se os slogans: “literatura é a arte de criar significados”, “literatura é a arte de cortar palavras”. Comentá-los teoricamente é romântico. Mas se o autor encontra dificuldades para interagir com a linguagem poética, quer na leitura, quer no fazer poético, naturalmente, o conteúdo implícito destas frases morre no seu nascedouro. Simplificando. Em outras palavras: Literatura é Arte. E quando existe entrega do poeta aos trabalhos cotidianos e secretos da técnica, da leitura, da contemplação e mesmo da ação, Poesia é literatura. Mas afinal, por que o mundo necessita de Arte? Porque fazemos arte e para que a usamos é aquilo que chamamos de função da arte. Citando algumas, e sem apego a teorias, pode-se dizer empiricamente que são feitas para decorar e/ou espelhar o nosso mundo, ajudar no dia-a-dia ou para explicar e descrever a história.

Refletimos. Se a arte é universal, tem importante função á sociedade, e literatura é a arte de criar significados, obviamente, está se disseminando arte na sua forma mais polivalente. Se poesia já significa território onde se multiplicam sentidos, imagine, então, um Sarau de Poesia (quer seja Sarau Poético, quer seja Poesia no Bar) realizado num bar ao alcance de todos! Encantador, não é. Por outro lado, quando se fala em assistir “poesia no bar”, logo surgem pejorativos do tipo: cair na boemia, na farra, entre outros que por hora deixaremos lá quietos nas mentes de alma pequena. Os donos destas mentes nem sempre – ou quase nunca – atingem a sensibilidade, estado de grandeza no ser pensante, para assim compreender o efeito função poética para nossas vidas. E a palavra “bar”, ao que me parece, solta nos bate-papos, somente possui um minúsculo significado: boemia. Será, mesmo?

Mas para atingir o estado de grandeza, inicialmente, é preciso reconhecer que, qualquer que seja a cultura, o ser humano produz duas linguagens a partir de sua língua: uma, racional, empírica, prática, técnica; e outra, simbólica, mítica, mágica. A primeira tende a precisar, denotar, definir, apóia-se sobre a lógica e ensaia objetivar o que ela mesma expressa. A segunda utiliza mais a conotação, a analogia, a metáfora, ou seja, esse leque de significações que circunda cada palavra, cada enunciado e que ensaia traduzir a verdade da subjetividade.

Para Drumonnd, a poesia “é negócio de grande responsabilidade, e não considero honesto rotular-se de poeta quem apenas verseje por dor-de-cotovelo, falta de dinheiro ou momentânea tomada de contato com as forças líricas do mundo, sem se entregar aos trabalhos cotidianos e secretos da técnica, da leitura, da contemplação e mesmo da ação”. Isso explica o valor literário atribuído a sua obra, entre os críticos e leitores.

O imaginário humano não se sustenta somente com a sensibilidade a que dispomos, é necessário formação, seja ela por meios acadêmicos ou leituras a respeito. O que vemos quando admiramos uma Arte depende da nossa experiência e conhecimentos, da nossa disposição no momento, imaginação e daquilo que o artista pretendeu mostrar.

E o segredo da Poesia (arte da palavra, em versos) vai além da métrica, da inspiração, do estar poeta. Assim como a noite precisa do dia, a lua precisa do sol para se completarem, obviamente, a poesia precisa da realidade, e por sua vez, a realidade precisa da poesia. Quando afirma-se de que poesia é negócio de grande responsabilidade, está se confirmando a sua importância para o ser humano; seja ela lida ou recitada, em nossa casa, na escola ou no bar. Invariavelmente, deve-se acreditar naquilo que se escreve com originalidade e respeito às palavras proferidas por Carlos Drumonnd de Andrade.

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