Uma noite de cultura

A Livraria Cultura é um dos espaços culturais mais agradáveis de Porto Alegre. Embora ampla, possui um ambiente aconchegante, onde se recende literatura, música e cinema; ao fundo, há um agradável café onde se sorve um capuccino podendo ler os principais jornais e revistas do país. É difícil circular pela loja sem que se saia, ao final, com um livro ou DVD.

Não é à toa que a intelectualidade para lá é chamada para sessões de autógrafos, sempre que lançam obras ou para um “bate papo” no seu Auditório. Neste vai e vem já passaram Leticia Wierzchowski, Fausto Chermont, Luís Fernando Veríssimo, Ruy Carlos Ostermann, Francisco das Chagas Leite Filho, Sergio Faracco, Luiz Antonio de Assis Brasil, Ziraldo e tantos e tantos outros.

Pois foi na Cultura que no último dia 28 fui cumprimentar o meu amigo Sérgio Agra, na noite de autógrafo do seu penúltimo livro (o próximo, disse-me, já vem a caminho), “O Corpo de Gioconda”. O livro possui uma apresentação de sóbrio bom gosto e cuja capa – escolha do próprio autor – é a fotografia sobre a Mulher na Rede, de Antonio Frilli, em fundo preto.

Como da outra vez, no lançamento do romance de Agra, “Mar da Serenidade”, havia uma longa e demorada fila quando cheguei. À minha frente, a professora Nahir Tessler, que amenizou a espera divagando com crítica aguda ao que sobra hoje sobre a nossa esfarrapada educação.

O livro é uma coletânea de crônicas publicadas aqui, no “Litoral”, e também em outros órgãos da impressa do Estado, a demonstrar a extraordinária capacidade criativa e literária do autor:

“Há um vento gemente que penetra pelas frestas das janelas, se sobrepondo ao bramido do mar. Isto me deprime. Para me aquecer, abro um Chablis. Ligo o rádio numa estação FM. Vislumbro o antigo e imóvel carrilhão de parede. Chequei a pouco do cemitério, onde não apenas sepultei meu velho pai, como decidi, numa vala à beira da estrada, idealizar o teu funeral”.

Ou:

“O bucólico cedera espaço ao ronco dos bólidos em disparada, às balas perdidas em tiroteios. Os amantes cultuam o virtual e delével amor, as mulheres destruíram a torre do servilismo e aos homens restou-lhes a eficácia dos eretores farmacológicos”.

Ou ainda:

“Tua voz, se ouvida agora fosse no silêncio da hora tardia, faria com que as fantasias brotassem dos escaninhos de minh’alma, liberando recordações: nossa música em surdina e o vinho generoso que tornavam suave nossa embriaguês”.

Isso e muito mais se encontra no “Corpo de Gioconda”, onde está o melhor de Agra, e se lê de um só fôlego.

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