Queda do analfabetismo foi lenta nos últimos 8 anos
“Na verdade os resultados são frustrantes se considerarmos as medidas e os esforços que foram feitos. O ritmo da regressão nos últimos anos foi inferior a 0,5 ponto percentual ao ano. Se não mexermos nesse ritmo, serão necessárias duas décadas para erradicar o analfabetismo”, aponta Maria Clara.
A principal estratégia do Ministério da Educação (MEC) para enfrentar o problema é o Programa Brasil Alfabetizado, criado logo no primeiro ano de governo. Ele apoiou com recursos e assistência técnica projetos de alfabetização de jovens e adultos em cerca de 4 mil municípios, com prioridade para aqueles que apresentam índices de analfabetismo mais altos. Em 2009, foram aplicados R$ 295,1 milhões no programa. O aporte em 2010, até julho, foi de R$ 385 milhões.
Para o coordenador do programa, Jorge Telles, o país deve comemorar o fato de que pela primeira vez a taxa de analfabetismo ficou abaixo dos dois dígitos. Ele destaca que foram as regiões Norte e Nordeste, justamente aquelas que são o foco do Brasil Alfabetizado, as que registraram a maior queda no índice. De 22,4% em 2004 para 9,2% na população nordestina e de 18,7% para 8% nos nortistas.
“Ainda temos como desafio a questão da escala. O governo federal não faz um programa por si só, o que ele faz é apoiar estados e municípios. Mas a ação ainda é tímida na ponta e não podemos forçar isso, o que fazemos é atender tudo o que o estado ou município pede”, afirma Telles, ressaltando que, em média, 1,2 milhão de alunos passaram pelo programa ao ano.
Ao comparar os números absolutos, a queda é bem mais tímida. Em 2004 o total de analfabetos no país era de 15,6 milhões e, em 2009, 14,1 milhões. Maria Clara aponta que muitos dos que participam do programa já tiveram acesso à escola e apresentam um nível “rudimentar” de leitura e escrita. São pessoas que não se declaram analfabetas nas pesquisas e por isso não entram na conta da redução. Para ela o desenho do programa é equivocado.
“Ele [o programa] supõe que em um período curto e com incentivos modestos, você consiga mobilizar as pessoas para participar. Mas os professores têm uma formação muito insuficiente e você não garante a qualidade, nem modifica as práticas de leitura e fundamentalmente não garante a continuidade dos estudos”, afirma.
A professora da USP ressalta que o problema é complexo e está associado a situações de exclusão e pobreza. “Não é um fenômeno social isolado”, pontua. Por essa razão, a efetividade só será maior quando for articulada com políticas intersetoriais que atraiam esse grupo para a sala de aula.
“Para um trabalhador, cortador de cana, não tem porque ele se desafiar a permanecer numa escola pouco atrativa, com recursos escassos. Algo que já se aprendeu é que fornecer óculos para essas pessoas e atendimento de saúde é uma coisa elementar”, aponta.
Segundo Telles, o MEC já está atuando a partir dessa perspectiva formando comissões intersetoriais entre as várias secretarias dos municípios para tornar o programa mais atrativo. Ele destaca que a concepção de educação ainda é muito infantilizada no país, o que afasta os adultos ainda iletrados. Ele acredita que o trabalho das escolas precisa ser mais pró-ativo. “Não adianta esperar que ele procure a escola para saber qual será o período de matrículas. A escola tem que procurar essas pessoas, fazer campanha de rádio, nas associações comunitárias”, afirma.
Maria Clara destaca que apesar de os resultados do programa não serem os esperados, a política nacional de Educação de Jovens e Adultos (EJA) é hoje muito mais institucionalizada. Os alunos dessas turmas, por exemplo, são contabilizados no repasse que é feito aos municípios pelo Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).
“Agora, essa etapa está incluída no programa do livro didático, da merenda, do transporte escolar, essa é uma mudança histórica, algumas condições foram dadas para que a política de EJA se desenvolva de forma institucionalizada”, ressalta.